segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Morin, programa, pré-interpretação e pseudo-contextualização da norma tecnológica (eNorma)

Quem não conhece Edgar Morin e a lucidez de suas análises? É, sem duvida, uma das cabeças bem-feitas do século XX.

Falando num contexto um pouco diferente, em que confronta estratégias e programas,  Morin diz: "é que um programa já está determinado antes mesmo da caminhada, e o caminho é uma corrente que vai no sentido favorável. Vamos avaliar a situação: será que podemos mudar o caminho? Aparentemente não."  A citação é de Aires José Rover (Morin).

Chamo a atenção para o trecho destacado, em que o pensador caracteriza um programa. De fato, qualquer programa, inclusive aquele de computador,  que incorpora uma norma tecnológica (eNorma), já está determinado, mesmo, antes da caminhada (operação). No linguajar sistêmico luhmanniano, a estrutura de expectativas é previamente definida e por ela transitará o fluxo operativo (clausura operacional). 

Esse traço dos programas confere à norma tecnológica algumas de suas características diferenciadoras: a pré-interpretação e a pseudo-contextualização, por exemplo. 

Por pré-interpretação,  entendo o fenômeno de fixação/seleção do sentido normativo a ser codificado num momento anterior,  bem anterior mesmo, ao da efetiva aplicação. O que é uma exigência da afirmação de Morin: para já estar determinado antes mesmo da caminhada!

Por pseudo-contextualização, designo o fenômeno da inexistência de um efetivo esforço de contextualização, uma vez que ele apenas se esboça na atividade típica da "programação", quando o programador procura antecipar-se, visionariamente, às possibilidades de eventos para os quais faz a determinação das soluções a serem incrustadas no algoritmo (programa). Embora esse trabalho, em geral, tenha um nível de especificação superior ao do legislador (quando gera a norma textual), ainda assim o programador trabalha num nível de abstração que não se compadece com uma efetiva atividade de contextualização.  É por isso que, no linguajar de Morin, de novo, os caminhos  já estão determinados antes da caminhada. 

Portanto, ao contrário das normas com as quais estamos habituados a operar o Direito, a norma tecnológica aplica-se automaticamente ao caso em exame,  sem um exercício de interpretação do aplicador (que é um agente automatizado) e sem uma real contextualização. 

Morin, com sua afirmação, deixa evidente, também,  o caráter vinculante absoluto da norma tecnológica. Ou não? 

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